23 de abril de 2013

A física do futuro (não-ficção)


Michio Kaku, 2011, EUA

Em "A física do futuro", Michio Kaku utiliza seu conhecimento em física, tecnologia e também seu contato com as mais recentes pesquisas científicas para elaborar uma visão sobre o futuro de nossa civilização. Vamos viver mais? Por quanto tempo? Qual será nossa matriz energética? Como será nossa relação com as máquinas? Como será nossa relação uns com outros? Essas são algumas das perguntas em foco neste relato interessante sobre as possibilidades e caminhos que a ciência abre para os próximos 100 anos (e mais).

Desafio
Michio Kaku reconhece a dificuldade de exercícios que se prestam a imaginar do futuro, mas assume o risco, pois avalia que a compreensão madura das leis da natureza são um instrumento poderoso para sondagem das relações de causa e efeito no universo:

"Hoje já não vivemos na era das trevas da ciência, quando se pensava que trovões e pragas eram obras dos deuses. Temos uma grande vantagem que Verne e Leonardo da Vinci não tiveram: uma sólida compreensão das leis da natureza.
Previsões serão sempre falhas, mas um jeito de fazê-las confiáveis ao máximo é compreender as quatro forças fundamentais da natureza que movem todo o universo. Sempre que uma delas foi compreendida e descrita, isso mudou a história humana" (p.24).

Princípio do Homem das Cavernas
Um aspecto bastante interessante e que funciona como referência central para as avaliações do autor é o que ele chama de "Princípio do Homem das Cavernas". Para aqueles que acham que a tecnologia afasta as pessoas e vai acabar levando os indivíduos à insensibilidade e ao isolamento, Michio Kaku afirma exatamente o contrário. Segundo ele, a tecnologia da TV não acabou com o teatro, as compras online não tiraram as pessoas das ruas, a internet não acabou com o cinema, a telefonia não eliminou as reuniões presenciais... Tudo isso, afirma, porque ainda somos os mesmos humanos modernos que surgiram na África há mais de 100 mil anos. Não há evidências que nossos cérebros, personalidade, desejos e sonhos tenham mudado de lá pra cá.

"A questão é: havendo um conflito entre a tecnologia moderna e os desejos de nossos ancestrais primitivos, esses desejos primitivos vencem sempre. É o Princípio do Homem das Cavernas. [...] nossos ancestrais sempre gostaram de encontros pessoais. Isso nos ajudava a criar vínculos com os outros e a ler suas emoções ocultas. É por isso que a cidade sem pessoas jamais aconteceu. [...] Esta é a razão pela qual o turismo cibernético nunca decolou.
[...] nossos antigos ancestrais sempre queriam ver algo por eles mesmos e não confiavam no que os outros diziam. Era crucial para nossa sobrevivência na floresta confiar em evidências físicas reais e não em rumores. [...]
Portanto, existe uma contínua competição entre High Tech e High Touch, quer dizer, entre ficar sentado numa cadeira assistindo a TV e estender a mão e tocar as coisas a nossa volta.
[...] esse é o Princípio do Homem das Cavernas: preferimos ter as duas coisas, mas, podendo escolher, ficamos com High Touch, como nossos ancestrais das cavernas" (p. 29-30-31).

Futuro
O autor organiza sua obra segmentando as previsões por tema -- computador, inteligência artificial, medicina, nanotecnologia, energia, viagens espaciais, riqueza e humanidade -- e analisando cada tema em três momentos -- num futuro próximo (até 2030), em meados do século (2030 a 2070) e num futuro longínquo (de 2070 a 2100).

As projeções de Michio Kaku, de máquinas fantásticas a processos que hoje nos soariam como mágicos, estão bem respaldas na ciência contemporânea e, por mais que o leitor não seja um especialista no assunto, não há como negar que a argumentação do autor as faz parecer bem verossímeis. Entretanto, a obra parece ter um caráter excessivamente otimista em relação à ciência, à tecnologia e ao capitalismo, sugerindo que o conhecimento humano vai, naturalmente, superar nosso momento de escassez e alcançar uma era de abundância e criatividade. Certo ou errado, o livro oferece uma leitura bem instigante, um retrato rico da ciência contemporânea e insights valiosos para a compreensão da nossa sociedade, nossa economia e nossa individualidade.

Reflexão
De acordo com Kaku, para que a humanidade aproveite todo o seu potencial, ela precisará, mais do que ciência, de sabedoria. Ele cita Kant para afirmar que se a ciência é conhecimento organizado, a sabedoria seria a vida organizada. Aí está a reflexão final dessa interessante especulação sobre o futuro; um texto que olha pra frente, mas que certamente revela muitas coisas importantes sobre o nosso mundo de agora.

"A chave, portanto, é encontrar a sabedoria necessária para empunhar esta espada da ciência. [...] Na minha opinião, sabedoria é a capacidade de identificar as questões cruciais do nosso tempo, analisá-las de diferentes pontos de vista e perspectivas e depois escolher a que cumpre algum nobre objetivo e princípio.
Na nossa sociedade, é difícil encontrar sabedoria. Como disse Isaac Asimov, 'O aspecto mais triste da sociedade neste momento é que a ciência acumula conhecimento mais rápido do que a sociedade acumula sabedoria'. Ao contrário da informação, ela não pode ser distribuída via blogs e conversas pela internet. Como estamos nos afogando num oceano de informações, o artigo mais precioso na sociedade moderna é a sabedoria. Sem sabedoria e perspicácia, vagamos ao léu e sem propósito, com uma sensação de vazio depois que acaba a novidade das ilimitadas informações" (p.386-387).